FILOSOFIA da STOA -- As Teses de Zenão e Cleanthes
(c) Ciro Moroni Barroso
Lançado no Rio de Janeiro em Agosto de 0019 por:
A Stoa Poikile
A Galeria das Pinturas [Stoâ Poikîle] no centro de Atenas, é o local de instalação da Stoa filosófica, próximo a 301 a.C., por Zenão de Cítium, um greco-fenício.
A doutrina dos Estóicos, portanto daqueles que ensinam na Galeria, era uma continuação, na Ética, da doutrina de Antisthenes, um severo socrático de três gerações anteriores, que ensinava uma filosofia de austeridade e firmeza de caráter: esta que recebeu o sentido posterior de “estoicismo”.
O jovem Zenão, filho de próspero mercador Fenício, havia chegado a Atenas uns 12 anos antes, se tornando estudante de Filosofia. Como estudante, ele propõe uma síntese que é a Filosofia original da Stoa: na Física e na Lógica, uma nova leitura de platônicos e aristotélicos, e na Moral, a orientação cínica de Antisthenes.
Cleanthes de Assos (na Trôada) era cinco anos mais novo que Zenão, e foi seu discípulo, havendo feito contribuições originais à Stoa, segundo o prof. Pearson. Ao passo em que as sínteses de Zenão resultam de seu esforço lógico sobre os autores, Cleanthes é um filósofo do tipo intuitivo, sendo sincero devoto da ordem dos deuses olímpicos. Sendo poucas as indicações biográficas, ao que parece Cleanthes era homem muito forte e auto-confiante [pugilista]. Após se dedicar a apreender com toda atenção o quadro filosófico que lhe desenhava Zenão, suas teses indicam um regime de estudos dos autores, e meditações contínuas.
Cleanthes foi autor de muitos tratados de física e lógica, incluindo um estudo em 4 volumes sobre Herácleitos [não preservado]. Seu Hino a Zeus é um marco filosófico/teosófico do paganismo. Segundo a tese em Duhot, tanto a tradução grega do Velho Testamento feita pelos sábios hebreus de Alexandria, quanto a mescla doutrinária-lendária dos primeiros cristãos, foram beneficiárias de muitas formas das doutrinas estóicas, de sua teologia, do Hino de Cleanthes, da ética de Epictetos.
Na Introdução de sua Coletânea de fragmentos dos dois fundadores da Stoa, o prof. de Estudos Clássicos de Cambridge A. C. Pearson sustenta que contribuições de inspiração heraclítica de Cleanthes, como a concepção do tonos, não confirmam a imagem de um filósofo de posição secundária. Nas leituras de Pearson, contrariando as leituras eruditas até o séc. XIX (e reassumidas por Arnim e Bréhier no séc. XX) não é Crísipos quem de fato estabelece o "Cânone Estóico". Este cânone seriam as teses de Cleanthes dando acabamento perfeito ao panteísmo dinâmico do iniciador Zenão.
Duas colunatas delimitavam a entrada da Ágora: a Stoa era a colunata do lado esquerdo de quem entrava
Principais Obras Citadas
1) Pearson, Alfred Chilton, The Fragments of Zeno and Cleanthes – with introduction and explanatory notes, Cambridge Univ. Press, 1891, 344 pags. New York Arno Press, 1973. The Cornell University Library Digital Collections, 2012
archive.org/stream/thefragmentsofze00zenouoft#page/n1/mode/2up
2) Arnim, Hans Von, Stoicorum Veterum Fragmenta, 1903, 1905, Berlim
archive.org/query=Stoicorum Veterum Fragmenta
3) Kury, Diôgenes Laêrtios - Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres, trad. do grego, introd. e notas, Mário da Gama Kury, Edit. Univ. de Brasília, 1987.
4) Hicks, Lives of Eminent Philosophers - Diogenes Laertius, Robert Drew Hicks trans., Harvard Univ. Press. 1972. (First published 1925, Cambridge)
wikisource.org/Lives_of_the_Eminent_Philosophers_Hicks
5) Bett, Sextos Empiricus: Against the Logicians I, II [Ad. M. VII, VIII] Richard Bett trans.& editor, Cambridge Univ. Press, 2005
6) Bréhier, Émile, La Théorie des Incorporels dans l’Ancien Stoïcisme, Lib. Philosophique J. Vrin, [1908, 1928] 1997
7) Long, Anthony, Hellenistic Philosophy – Stoics, Epicureans, Sceptics, Univ. California Press, (1974) 1986
8) Long, A.A. & Sedley, D.N., The Hellenistic Philosophers – Vol. I - Translations of the Principal Sources with Philosophical Commentary, 1987
Imperador Romano Marco Aurélio, séc. II. Militar e escritor estóico helenizado
Atenas Ano 477 da Fundação -- 300 aC
[168] Cleanthes de Assos... chegou a Atenas com quatro dracmas... encontrando-se com Zênon passou a estudar filosofia, demonstrando grande dedicação, e permaneceu fiel à sua doutrina. Sua operosidade tornou-se famosa, pois sua extrema pobreza obrigava-o a trabalhar para viver. Assim, enquanto à noite tirava água dos poços de jardins, durante o dia exercitava-se na argumentação... Dizem ainda que foi levado aos tribunais para explicar de onde tirava os meios de vida, sendo uma pessoa de constituição física sã e robusta, porém foi absolvido ao apresentar como testemunha o jardineiro junto ao qual tirava água dos poços, e a vendedora de farinha para quem moía trigo. [169] Os juízes do Areópago ficaram satisfeitos e decretaram que lhe fossem dadas dez minas... [Kury, VII]
A lista das obras de Cleanthes [acme 290 aC] demonstra sem dúvida que ele foi filósofo original, desenvolvedor das teses de Zenão, não apenas um seguidor...
Alguns dos 50 Títulos de Cleanthes em Diog. Laércios VII. 174:
Sobre a Filosofia Natural de Zênon (2 v.) // Interpretações de Herácleitos (4 v.) // Lógica (3 v.) // Os Predicados // Do Tempo // Da Sensibilidade // Da Arte // Do Impulso // Antiguidades // Dos Deuses // Do Casamento // Dos Poetas // Do Dever (3 v.) // Das Leis // Do Fim Supremo // O Estadista // Da Realeza
Sua dedicação à leitura das teses em Herácleitos de Êfesus, fonte de suas melhores contribuições teóricas, seu Hino a Zeus, suas várias referências lógicas, éticas, físicas, literárias, mostram um espírito persistente, sistemático, analítico. Se era pouco veloz nos raciocínios e frases, isto seria devido à sua condução intuitiva do processo analítico, o que seria sem dúvida bastante estranho aos procedimentos erísticos e dialéticos dos filósofos sofísticos ou pirrônicos, que lhe dirigiam gracejos (Conforme Tímon)... Cleanthes não se importunava, e respondia: “Somente eu sou capaz de suportar o fardo de Zênon”.
O Herói Heraklês aparece nesta procissão entre Deuses Olímpicos, na Atica de cerca 500 aC. Como semi-deus estreante, Heraklês parece um tanto assustado ou preocupado no desfile, levando um poderoso tacape, junto aos Imortais... Um dos deuses parece lhe dirigir uma anedota... "Ó Heraklês, por algum tempo ainda farás uso desta alavanca entre os mortais"! ...
Algumas das principais obras de Zenão de Citium:
[Diog. Laércios VII. 4; 39; 134; 157]
Origem dos Deuses, ou da Teogonia de Hesíodo [Nat. Deo. I, xvi] // Da Substância // Do Universo // Da Alma // Da Vida Segundo a Natureza // Do Impulso, ou da Natureza Humana // Das Paixões // Da Visão // Do Dever // Da Lei // Ética // Sobre a Lógica // Dos Universais // Da Educação Helênica // Questões Pitagóricas // Dos Sinais (Divinatórios) // Problemas Homéricos (5 v.) // Da Leitura da Poesia // Das Espécies de Estilo // Arte Retórica // Recordações de Crates
Entre centenas de fragmentos que se dispersam, e que se repetem, de Zenão e Cleanthes, de Crísipos e Diógenes da Babilônia, de Panécios e Possidônios – preservados por Stobeos, Laércios, Galenos, Sextos Empíricos, Plutarcos, Sêneca e Cicero - nenhum texto original dos antigos mestres Estóicos foi preservado – com exceção do Hino a Zeus, de Cleanthes de Assos, colecionado por Stobeos em seus Extratos Físicos e Morais [Eclogae, I. 1.12].
O original está em Pearson, C. 48. O Hino com 39 linhas tem diversas falhas revistas e interpolações feitas pelos estudiosos. Pearson faz 36 anotações ao texto.
O Hino a Zeus e diversos textos estóicos romanos, incluindo os tratados de Cicero, Sêneca, Epictetos, Marco Aurélio, e o capítulo VII de Laércios, estão na coletânea Les Stoïciens, organizada e traduzida por Émile Bréhier, editada por P.-M. Schuhl, 1962, 1.500 pags.
Jean-Joël Duhot em seu estudo sobre Epictetos e a sabedoria estóica no mundo romano demonstra como “Por intermédio do judaísmo helenístico e da pregação de Paulo [de Tarso], o Estoicismo tornou-se um tanto o passageiro clandestino do Cristianismo”. Na tradução para o grego do texto canônico bíblico, feita pelos “Setenta Sábios Hebreus de Alexandria”, temos uma reconstrução, em terminologia estóica, da antiga tradição teológica mesopotâmica-hebraica – e não uma versão religiosa “inspirada”...
Por sua vez, Paulo de Tarso, o pregador do sincretismo religioso pré-cristão, estaria fazendo citação direta do Hino a Zeus no tema da “nossa semelhança e descendência física” ao grande Deus Universal... (Também presente no filósofo estóico contemporâneo Arato). [Epicteto e a Sabedoria Estóica, Ed. Loyola, 2006, pags. 215; 207] [Bayard Éditions, 1996]
Um Hino para Zeus
Long & Sedley, The Hellenistic Philosophers, 54. I [pag. 326]
Most majestic of imortals,
many titled, ever omnipotent Zeus,
prime mover of nature, who with your law
steer all things, hail to you [!]
For it is proper of any mortal to address you:
We were your offspring, and alone of all mortal creatures
which are alive and tread the earth we bear a likeness to god.
Therefore I shall hymn you and sing for ever
of your might.
All this cosmos, as it spins
around the earth,
obeys you, whichever way you lead,
and willingly submits to your sway.
Such is the double-edged fiery
ever-living thunderbolt which you hold at the ready
in your unvanquished hands...
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